De volta ao Brasil
Feijão, farofa, água de coco. Voltar a falar e ouvir em português. O jeito aberto dos brasileiros. Deixar para trás o castelhano, a riquíssima cultura andina, a deliciosa e variada culinária peruana e o desafio de estar em outro país. Mas a expectativa de conhecer um pouco do Brasil que não conheço, do qual ouvi sempre tanto falar, do qual dizem que eu faço parte, essa exploração da própria pátria me deixou ansiosa de chegar.
Peru tropical
De Cusco partimos para Puerto Maldonado, já na floresta amazônica. Apesar de ser a capital, a cidade é pequena, tranqüila. Muito calor, sol, frutas e sucos. As pessoas pareciam mais receptivas. Ficamos na casa do César, que nos convidou para ficar lá sem nem nos conhecer. Perguntei se ele sabia onde eu poderia acampar, ele perguntou se podia ser num ligar simples, se não tinha problema. É claro que não tinha. A casa, assim como ele, era realmente muito simples – estrutura de madeira e banheiro de fossa numa casinha no quintal. Acabamos nem precisando acampar, dormíamos num quarto. Ficamos lá mais ou menos uma semana. Encontramos Kae e Gina, artesãos peruanos que já havíamos cruzado em Arequipa. No último dia em Puerto Maldonado todos vendemos muito bem, para mim e para o Thiago acho que foi o melhor dia até hoje. "Quando chega uma onda de boa sorte, outra de má está vindo", alertou o Kae. O pior é que ele estava certo; anunciava o que estava por vir.
Chegamos até a última cidade peruana antes do Brasil pedindo carona. Muita selva, estrada de terra, cheiro de mata. A única maneira de chegar a Assis Brasil, primeira cidade em terras brasileiras, é de táxi. Quando chegamos, já deu para perceber a diferença de cara - os traços indígenas já misturados com brancos e negros, pessoas mais altas, ruas pavimentadas e a cidade mais arrumadinha. Comemos num restaurante self-service, coisa que não lembro de ter visto no Peru - arroz, feijão, farinha, macarrão e salada. Que delícia. Bem mais fácil negociar um prato sem carne em português.
No mesmo dia tomamos um ônibus para Rio Branco. Percebemos que do lado brasileiro a selva foi trocada pelo asfalto. Tudo estava devastado, tranformado em pasto. Ao invés de árvores, gado. E chegou a onda de má sorte. Só conseguíamos dinheiro para comer e para pagar o hotel. Rio Branco é bem ajeitada, muito diferente do que eu poderia imaginar, mas sem nenhum grande atrativo. Na mata o interessante não é a cidade, é a mata.
Conhecemos os malucos e micróbios. Nos países onde estivemos percorrendo, quem trabalha com o artesanato é artesão, e quando é um viajante e chega a gerar interesse nas outras pessoas. Aqui não existe artesão: é maluco ou micróbio, e geralmente gera medo ou desprezo. A coisa aqui é bem mais marginalizada.
O micróbio vai com a roupa do corpo para onde for, dorme em qualquer lugar, fala o que quer na hora que quer, "micróbio não tem medo de nada", já canta o Ventania. Até agora não tivemos problema com ninguém, a convivência tem sido boa. Mas acabamos sempre nos distanciando, trabalhando mais isolados, buscando a tranqüilidade.
Decidimos ir para Porto Velho. Encontramos o Kae em Rio Branco, ele estava sozinho, e decidiu ir para a estrada pedir carona com agente. Dormimos duas noites num posto na saída da estrada - nenhum caminhoneiro queria levar agente. Conseguimos carona até uma cidadezinha uns quilômetros mais para a frente. Tivemos que dormir lá. No dia seguinte decidimos nos separar. Eu botei ele num caminhão que o levaria alguns quilômetros mais adiante. Acho que o azar estava com ele: logo depois eu e o Thiago conseguimos uma carona de uns 200 quilômetros. O caminhoneiro nos deixou na estrada, e o primeiro carro que passou nos levou até Porto Velho.
Mi
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